Ausência de inovação tem um preço, mas ninguém o enxerga.
Eu costumo dizer que tecnologia e inovação não é sobre conveniência, mas sim sobrevivência. Você pode usar seu smartphone para comprar comida que será entregue na porta da sua casa, ou dirigir perfeitamente em cidades que nunca visitou antes usando waze, ou dobrar seu capital investindo em crypto assets, ou ainda melhorar o email enviado ao seu chefe usando IA.
Super conveniente, certo? Mas esta é a sua percepção da tecnologia como alguém que vive em um país de relativa estabilidade política, em um bairro longe da periferia de alguma capital e com certeza milhares de km distante de zonas de guerra. Basicamente uma vida de muita sorte e privilégio. Mas esta não é a realidade da vasta maioria da população global. Milhões de pessoas sobrevivem em regiões altamente violentas, em meio a conflitos geopolíticos, sob regimes totalitários, ou enfrentando fenômenos naturais destrutivos.
E essas pessoas sobrevivem usando tecnologia, exatamente como estamos presenciando no Rio Grande do Sul. Chats para coordenar com familiares e voluntários; redes sociais para viralizar campanhas de financiamento coletivo e disparar o senso de urgência da sociedade; plataformas de ecommerce para continuar operando o comércio que foi fisicamente destruído; apps para transacionar dinheiro; e literalmente centenas de outras soluções.
Se em uma realidade paralela a Internet tivesse sido proibida, e nenhuma dessas tecnologias digitais existisse, o impacto negativo seria de uma magnitude estrondosa. Imagine você ilhado na sua casa, potencialmente ferido, sem água, luz, medicamentos e telefone, sem nenhum contato com o mundo externo, esperando alguém vir lhe salvar, ou trazer suprimentos.
Consegue vislumbrar por alguns minutos o quão devastador seria sobreviver em tal realidade?
O ponto é que se vivêssemos nesta realidade paralela, absolutamente ninguém pensaria:
“Poxa, se a Internet não tivesse sido proibida, 99% das vidas que se foram nessa tragédia poderiam ter sido salvas. Quem proibiu as inovações digitais de se perpetuarem é o atual responsável pelas mortes”.
Este é um dos dilemas explorado por Frédéric Bastiat no That Which is Seen and That Which is Not Seen.
É impossível apontar as causas e medir as consequências de algo que deixou de existir devido a uma decisão equivocada no passado. No entanto, é totalmente factível intui-las e mensurar as implicações dessa estagnação, principalmente se as tecnologias já existem em outra indústria e ainda não foram adotadas por restrições artificiais.
Esta é a nossa realidade com tecnologias digitais (Internet, Blockchains, IA, etc) mantidas fora dos sistemas de governança atuais.
Como o governo não tem concorrência, e portanto não existe uma estrutura dinâmica de experimentação e inovação em governça, um universo de soluções para modernizar infraestrutura de cidades, saneamento, e alocação de capital de forma eficaz, simplesmente não existe.
Em termos de governança, vivemos quase que literalmente na realidade paralela que descrevi anteriormente. Vivemos no século 19. Estamos na era das cartas, enquanto nossos vizinhos na outra realidade estão fazendo vídeo conferências em tempo real com dispositivos móveis. Estou falando aqui em centenas de milhões de vidas perdidas e trilhões de valor represados atrás de um muro de burocracia e interesses escusos que tornam política e gestão pública um ambiente completamente estéril a novas ideias.
Combater alagamentos e desastres naturais é um desafio gigantesco que claramente os governos atuais que sentam sobre trilhões em orçamento não tem a menor capacidade de resolver. Legislações apenas movem as cadeiras de lugar de um titanic que afunda. E além da falta de capacidade em inovar para resolver o problema, ainda usam sua máquina de poder para criar obstáculos ao surgimento de novas ideias, seja drenando os recursos da economia em forma de impostos, seja através de leis monopolistas sobre governança e infraestrutura.
Por exemplo, um dos grandes problemas na coordenação de doações é a falta de confiança em endereços PIX. O doador não sabe onde o dinheiro será alocado, quanto já foi doado para aquela entidade, etc. É uma caixa preta que impede muita gente de doar ou reduz a quantidade.
Mas adivinhe, este problema já foi resolvido há anos na indústria crypto. Inclusive doações bilionárias para ajudar a Índia durante o covid, ou a população Ucraniana durante o início da guerra, foram feitas usando crypto, por sua natureza pública e global. Você pode acompanhar em tempo real quais as doações, qual o valor acumulado naquele endereço e como o dinheiro está sendo usado. Golpistas tem um desafio muito maior em atuar, uma vez que a comunidade e bots estão monitorando e apontando comportalmentos suspeitos.
Se vivêssemos em jurisdições que já tivessem adotado cripto, estaríamos conectados a uma rede internacional de doação. Qual seria o impacto no valor arrecadado e, principalmente, na qualidade da alocação desse recurso?
Quanto aos alagamentos, poderíamos testar inúmeras tecnologias para aprimorar a vazão das águas. Lembre-se, um ser humano lidera uma equipe que criou um foguete que pousa. Quando criamos o ambiente correto com suficiente liberdade, capital e talentos, a sociedade encontra uma forma de sair da carta para a videochamada (ou das inundações para infraestruturas resistentes à catástrofes) em algumas gerações, principalmente com o advento das IA que expandem nossa capacidade criativa para além do que podemos imaginar.
Se nossa sociedade deseja superar os desafios do século 21 (mudanças climáticas, monopólio de super-inteligências, crescente autoritarismo, bio-armas, etc) nós fundamentalmente precisamos de novos modelos de governança que sejam construídos sobre premissas da era digital: descentralização, agilidade, transparência e voluntarismo. Precisamos investir radicalmente em inovação social e startup societies.
Mas para isso acontecer, esta ideia precisa continuar crescendo exponencialmente com novos empreendedores, cientistas, artistas e intelectuais, puxando esses conceitos para a janela de overton o mais rápido possível.