Como assim? Se você sai do país, não é porque desistiu de qualquer possibilidade de transformação interna?
Não exatamente. Explico.
Segundo Albert Hirschman no seu livro Exit, Voice, and Loyalty, os dois principais mecanismos de recuperação de uma organização se dá através de Saída e Voz. Mas estas estratégias funcionam melhor se combinadas.
Por exemplo, se você vive em um país onde o Exit não é uma possibilidade e a liderança política não é responsiva quanto a Voz - reclamações, protestos, etc. - o país continuará indefinidamente no seu processo de degradação, tomado por corrupção e incompetência, independente do quão barulhento e frequente sejam as manifestações.
Afinal, a reação da população à queda na qualidade não impacta diretamente a liderança política, pois não gera redução da receita (como aconteceria com um produto no mercado), uma vez que é mandatória, e protestos são facilmente neutralizados através do monopólio da violência.
No entanto, quando a possibilidade de Exit é mais viável, seja literalmente mudando-se para outro país, ou simplesmente trabalhando para empresas de fora ou comprando ativos externos, o impacto na organização começa a ser mais perceptível e doloroso.
O país não quer ver sua arrecadação diminuindo. Não quer perder seus talentos. Não quer ver sua moeda desvalorizando. Não quer sua população comprando ativos cuja tributação é difícil ou impossível, como algumas criptos.
Neste cenário a organização terá duas reações: A) aumentar as barreiras do Exit ou B) ser mais responsivo à Voz da população.
A) As barreiras do Exit geralmente acontecem através do aumento do custo financeiro/político da saída, como impostos para movimentação de capital offshore, taxação de compras internacionais, censura, bloqueio de passaporte, e literalmente muros; e
B) o custo social/emocional, que se dá através de rótulos como "traição" ou "dissidência", e de campanhas patrióticas através de intensa e constante propaganda política, o que gera o fenômeno da Lealdade (Loyalty), que tem um papel emocional considerável na decisão de Sair.
Se este movimento de criação de atrito não tem resultados, e o Exit continua sendo uma possibilidade clara e real para a população, a única alternativa para o governo é reformar sua estrutura interna para corrigir os problemas (ou negar a situação até o colapso).
Por isso, se a liderança política atual não for responsiva, apenas mobilizações não serão efetivas, não importa o quão barulhento sejam os movimentos. Basta olhar o histórico brasileiro para perceber o quão pouco transformadores foram as reivindicações nas últimas décadas.
No entanto, com o advento da Internet, da mobilidade, do trabalho remoto, e dos cripto ativos, a quantidade de portas para o Exit aumentou massivamente.
Esse fenômeno é nossa principal arma para aumentar a efetividade da Voz e talvez atingir algum nível de reforma. Com capital, talentos e narrativas extrapolando as fronteiras brasileiras, o governo será atingido de forma muito mais certeira. Aqueles que optarem por ficar, terão sua Voz mais ouvida e sempre poderão usar o Exit como ameaça real (explícita ou implícita) na sua argumentação com a liderança política.
Portanto, defender a possibilidade de saída, e até mesmo fazer suas malas em direção a outros destinos, é uma das mais poderosas atitudes se você tem alguma esperança em transformar o país.
Embora paradoxal, é na possibilidade e materialização do Exit que sua Voz se torna mais poderosa e eficaz.
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